Desde o início da tramitação do Projeto de Lei número 38/2017, que deu origem à Lei 13.467/17, comentários e opiniões assolam (e de forma generalizada, no meu entender) as novas regras celetistas.
Por óbvio, como qualquer tema, há sempre duas vertentes, aqueles que defendem a proteção exacerbada dos trabalhadores e aqueles que tentam de alguma forma equilibrar as condições de trabalho e moldar da melhor maneira possível a legislação dentro da realidade atual.
Em uma primeira análise, se considerarmos a evolução histórica e retroagirmos até os tempos da escravidão, onde o trabalho era aplicado como PUNIÇÃO e, inclusive, a termologia da palavra TRABALHO derivada do latim da palavra "TRIPALIUM", que nada mais era do que um instrumento de tortura utilizado como forma de castigo nos escravos antes da revolução industrial, é nítida a associação que logo é feita pela vulnerabilidade do trabalhador.
Somente no século XIX a “servidão” tornou-se extinta com a substituição pelo trabalho assalariado, trazendo assim valor social com a chamada Revolução Industrial, importante marco no universo do trabalho, nascendo-se a “sociologia industrial” devido a necessidade de maior aprofundamento nas mudanças estruturais que ocorreram não somente nas organizações do trabalho, mas também na sociedade como um todo.
Fazendo uma breve análise da teoria trialista, onde os fatores CONDUTA x NORMAS x VALORES se integram com o objetivo de trazer soluções práticas ao homem (sociedade) e ao seu cotidiano, visando criar uma forma mais eficaz de aplicabilidade e justiça a fim de beneficiar o bem-estar social de todos, verifica-se que a relação de trabalho vem sofrendo diversas modificações, contudo, há grande resistência, seja ideológica, seja política, em se atualizar ou modernizar as normas que regem os direitos dos trabalhadores e, porque não, dos empregadores.
A sociedade vem se modificando de forma acelerada, principalmente por intermédio da tecnologia e, com isso, todos os problemas sociais também vão se modificando. Por tais questões, no meu entender é retrógrado idealizar que uma proteção severa a classe trabalhadora possa ser a melhor solução aos problemas laborais.
Pelo contrário, com toda evolução social e, principalmente, por conta da globalização e os resultados negativos que o acompanham (crise econômica), necessário se faz uma profunda análise em adaptar e flexibilizar as normas existentes, cabendo aqui, uma análise individual de cada caso em específico, seja de caráter transitório ou não.
Partindo então do conceito do respeitável intelectual, jurista e um dos criadores da sociologia, Max Weber, onde o indivíduo é livre para construir sua própria realidade, por que então este também não é livre para determinar qual seria o benefício laboral que melhor lhe favoreça?
Historicamente, o poder econômico-financeiro sempre impôs sua vontade perante aqueles que são hipossuficientes, nesse caso, o trabalhador. Contudo, há que se refletir: nos dias atuais a hipossuficiência cabe a todos? No meu entender não, principalmente pelos princípios da autonomia da vontade e boa-fé.
Retomando ao tema “Reforma Trabalhista”, pude verificar diversas críticas à nova termologia “hipersuficiente”, onde trazem a questão de que o trabalhador jamais poderia assim ser enquadrado na relação de trabalho, pois este não é capaz de negociar o seu contrato de trabalho com o empregador.
Isso tudo porque o artigo 444 da CLT traz o texto: “As relações contratuais de trabalho podem ser objeto de livre estipulação das partes interessadas em tudo quanto não contravenha às disposições de proteção ao trabalho, aos contratos coletivos que lhes sejam aplicáveis e às decisões das autoridades competentes.”
E ainda traz em seu parágrafo único: “A livre estipulação a que se refere o caput deste artigo aplica-se às hipóteses previstas no art. 611-A desta Consolidação, com a mesma eficácia legal e preponderância sobre os instrumentos coletivos, no caso de empregado portador de diploma de nível superior e que perceba salário mensal igual ou superior a duas vezes o limite máximo dos benefícios do Regime Geral de Previdência Social.”
Ora, a legislação traz que as relações contratuais de trabalho podem ser objeto livre estipulação das partes, DESDE QUE NÃO CONTRAVENHA AS DISPOSIÇÕES DE PROTEÇÃO AO TRABALHO, ou seja, há um nicho de direitos básicos e protegidos constitucionalmente que devem ser respeitados, e isso, com certeza, todos estamos de acordo que é inalterável, indiscutível.
Fazendo uma análise concisa e objetiva, não podemos generalizar e julgar de forma tão engessada as novas regras advindas da reforma. Em um cenário tão crítico e economicamente devastador que o Brasil se encontra, precisamos dar uma chance as novas regras e adequações na vida prática e, não apenas, o que diz a teoria.
A questão é que necessidades mudam o tempo todo e, por isso, mais do que necessária as adaptações e vivências cotidianas para de fato podermos apontar o que é falho, o que é abusivo e o que é aplicável.
Concluo esse artigo – que mais considero como uma reflexão – com a certeza de que, em que pese ser necessária em alguns aspectos a reforma trabalhista e adequação da legislação, esta de modo geral soou precipitada em diversos aspectos, talvez por a população não estar preparada para lidar com grandes alterações e os poderes (legislativo, executivo e judiciário) para cumprir integralmente suas funções. Todavia, acredito que para deixarmos de ser um país considerado meramente litigioso, necessitamos equilibrar as relações e abrirmos nossa mente para o novo.
Alessandra Bezerra - OAB/SP 309.600
Advogada e Sócia do escritório L|A Bezerra Advogados
Doutoranda em Direito pela Argentina John F. Kennedy (UK)
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